Assessoria de Imprensa em Cuidados Paliativos?!

Por Fábio Duarte - Communication Consultant

Há muito que se fala do declínio dos earned media e da assessoria mediática, perante o gradual decréscimo da confiança das audiências nas notícias. Mas será que a comunicação, como a conhecemos, tem os dias contados, ou estará antes a passar por um processo de transformação?!

Pelo título que elegi, e para quem conhece um pouco do meu percurso profissional, poderá pensar que este artigo será dedicado à comunicação em saúde. Pois bem, não poderiam estar mais enganados. É apenas uma mera analogia.

O objetivo que me leva a escrever este artigo prende-se com uma reflexão que tenho vindo a fazer nos últimos anos, fruto de várias conversas com colegas, clientes, amigos e outros tantos. “A assessoria de imprensa tem os dias contados”, dizem uns. “O futuro da comunicação está na owned e shared media”, afirmam outros. Pois bem, permitam-me que desconstrua estes pensamentos, e demonstre que tanto os media, quanto a assessoria de imprensa, não estão de facto em Cuidados Paliativos, mas antes bem de saúde.

Em primeiro lugar, e ainda que os owned e earned media estejam, comprovadamente, a ganhar relevância junto das audiências, importa não nos esquecermos que os media permanecem importantes na construção da agenda pública e, em última instância, no desenvolvimento das perceções que todos nós temos a respeito de cada tema, personalidade ou organização.

Prova disso são os níveis de confiança das audiências em relação aos meios de Comunicação Social. Recorrendo aos dados do Digital News Report 2022 – um estudo desenvolvido pelo Reuters Institute for the Study of Journalism em conjunto com a Universidade de Oxford – verifica-se que 61% dos portugueses dizem confiar nos media, tornando-nos o segundo país melhor posicionado numa lista de mais de 40.

Apesar do estudo também revelar que estes níveis de confiança têm vindo a baixar ao longo dos anos, verifica-se uma estabilização dessa confiança de 2021 para 2022, depois de uma subida de 5 pontos percentuais de 2020 para 2021 – um reflexo claro do papel que os media tiveram durante a pandemia da Covid-19.

Aproveitando justamente o tema da pandemia, olhemos para algumas tendências que se verificaram desde então: face ao desconhecimento da pandemia e das suas consequências no início de 2020, e, paralelamente, à multiplicidade de vozes que se ergueram para discutir o tema no espaço público, vários foram os portugueses que voltaram a consumir mais notícias em media tradicionais, numa busca por informação de qualidade e credível.

Mais recentemente, o conflito entre a Ucrânia e a Rússia voltou a reafirmar a importância das notícias de alta qualidade, com o Digital News Report 2022 a destacar que 57% dos inquiridos considera que os media fizeram um bom trabalho ao manter as suas audiências informadas sobre o conflito. Outro fenómeno que se registou, nomeadamente este ano face ao período homólogo, foi o crescimento do consumo de notícias em Portugal nos meios online (de 77% para 79%) e nas redes sociais (de 55% para 57%), o que comprova a importância do digital na disseminação de informação. Prova disso é também o gradual aumento de assinaturas digitais de jornais em Portugal. A título de exemplo, e de acordo com a Associação Portuguesa para o Controlo de Tiragem e Circulação, o jornal Expresso passou de 30.382 assinaturas no último trimestre de 2019 para 47.171 em igual período de 2021. Também o Público passou de 19.564 para 40.456 assinaturas entre o quarto trimestre de 2019 e o quarto trimestre do ano passado (números que continuam a aumentar em 2022).

Percebe-se, desta forma, que a confiança nos media é uma realidade ainda bastante marcada na nossa sociedade, e à qual as marcas não são indiferentes. Contudo, aquilo que aparenta ser uma oportunidade para as empresas continuarem a apostar na sua presença mediática, está a representar um verdadeiro desafio de assessoria de imprensa.

Que novos desafios para a assessoria de imprensa?

Uma das vantagens de trabalhar consultoria de comunicação passa por conseguir ter uma visão ampla da forma como as marcas trabalham e compreendem a comunicação. Com base nesta perspetiva, tem sido possível perceber que a pandemia trouxe uma maior necessidade de as empresas demonstrarem a relevância da sua atividade para a sociedade e para a economia. Vimos isso com as ações de apoio ao combate à Covid, medidas de teletrabalho implementadas, campanhas com mensagens de esperança, ou até, mais recentemente, com o conflito na Ucrânia. Porém, assistimos, em simultâneo, a uma crescente saturação dos media, que se viram obrigados a dedicar grande parte da sua agenda mediática e recursos à cobertura destes macro temas.

Perante esta realidade, tornou-se imperativo voltarmos a recentrar a prática de assessoria de imprensa no seu elemento-chave:

E-S-T-R-A-T-É-G-I-A

Mais do que nunca, o panorama atual está a levar a que cada profissional de comunicação olhe para as marcas e para aquilo que elas têm para dizer de forma mais engenhosa e, ao mesmo tempo, flexível. Mais do que quererem estar presentes, as marcas terão de focar-se em obter os resultados certos nos meios certos para atingir os targets certos.

Para o ajudar a atingir esse mindset estratégico, apresento-lhe aquelas que são as 5 regras que me acompanham em cada projeto de assessoria mediática:

  1. Pensar sempre como um jornalista. Não são os jornalistas que navegam nos nossos mares, mas sim o contrário. Quero com isto dizer que, antes de implementar qualquer ação de comunicação com destino aos media, deve-se sempre refletir sobre a relevância que o tema e a informação de que dispomos têm para os jornalistas, pois o que é importante para a marca, pode não o ser para os media. Nesse sentido, importa ter sempre em consideração os fatores-notícia, mas também o tipo de media que queremos atingir, a agenda mediática, etc.
  2. O envio do press release não deve ser a regra. Um mito que existe é que toda a informação passível de ser comunicável requer o envio de um press release a uma base de dados de jornalistas. Pois bem, esta é uma visão ultrapassada. Importa clarificar que o press release não é uma técnica de comunicação per se, mas antes uma ferramenta que serve de base da informação que é partilhada com cada jornalista. Para garantirmos resultados que aportem valor para as empresas, é crucial definir um plano tático de contactos estratégicos com jornalistas, para os quais o press release terá um papel fundamental na compreensão do tópico a comunicar pelo jornalista.
  3. Construir relação entre a marca e o jornalista. Mais do que uma abordagem de disseminação de informação para os media, hoje é necessário às empresas posicionarem-se enquanto fontes de informação relevantes para os media. Para o conseguirem, é fundamental que estas apostem na aproximação a jornalistas e editores core para o seu negócio, como forma de promover maiores níveis de familiaridade. Ao fazê-lo, estarão não só a suscitar maior interesse dos media em comunicações futuras, como, em algumas ocasiões, estes passam a procurar a marca para participar nos seus trabalhos editoriais.
  4. A assessoria de imprensa é muito mais que os media tradicionais. À medida que os canais de comunicação vão evoluindo, esta afirmação torna-se cada vez mais premente. Atualmente, uma estratégia de assessoria mediática deve ser multicanal, sem se cingir apenas aos tradicionais meios de comunicação (imprensa, rádio, TV e websites de media). Os podcasts, por exemplo, são um formato em crescimento e que abre espaço para impactar as audiências que os acompanham.
  5. A comunicação deve ser concebida a 360°. A vertente multicanal aplica-se igualmente neste último ponto, dado ser cada vez mais necessário que as empresas olhem para a sua comunicação de uma forma transversal e integrada. As audiências estão hoje mais fragmentadas, o que torna a visão estratégica indispensável no desenvolvimento de ações de comunicação que tenham potencial de serem trabalhadas simultaneamente em owned, earned, shared e paid media.

Ser estratégico é o primeiro e mais importante passo para que uma marca se torne relevante para os media. Adotá-lo permitirá, a médio-longo prazo, gerar informação noticiosa de maior valor sobre a empresa e, consequentemente, maiores níveis de familiaridade.